28. EXPLICAÇÕES

     - Peço-te desculpas, irmão. Agi precipitadamente.
    Foi assim que Checarion abriu diálogo com Caliel, assim que adentrou o laboratório. O ser celeste chegou ao local minutos depois de Margô e os outros aventureiros retornarem do Inferno.
      - Uau! Quem é esse? – quis saber Beterraba.
      - Pelas asas, outro anjo, né? – chutou Celeste.
   - Na verdade, senhoritas, sou um arcanjo. Minhas desculpas por chegar assim tão de repente, sem apresentações formais – respondeu Checarion, que logo em seguida explicou a todos quem era, de onde vinha e o que fazia por lá.
     - Fiz questão de rever Caliel antes de retornar ao Paraíso. Em verdade, além de minhas desculpas, vim convidar meu irmão a voltar comigo para lá – complementou o arcanjo.
     Caliel sorriu satisfeito com o convite. Porém, guardava uma dúvida fundamental.
     - O que fez mudares de opinião sobre mim? Compreendi que descobriste adulteração em meu relatório. Contudo, como se deu tal averiguação?
     Checarion fechou os olhos por um instante, respirou profundo e tornou a falar.
    - Verifiquei antigos relatórios teus. Analisei teu método de narrar os fatos, as formas que usas as palavras, a maneira com que te expressas. Assim, constatei que o relatório responsável por tua punição estava diferente dos demais: era um tanto breve, pobre e truncado, incompatível com as minúcias com que tu descrevias até as missões mais triviais.
     O anjo da guarda ainda não estava convencido. Por isso, Checarion continuou a explicação.
    - Também analisei o relato de outros anjos da guarda cujas missões da época de alguma forma se relacionaram com as tuas. Foi então que encontrei a narrativa do anjo Bariel, protetor de um humano chamado Dome Vorpa.
     - Já ouvi esse nome – comentou Baldo.
     - Sim! – exclamou Margô.
    - É o bruxo que serve o Senhor das Trevas – reconheceu Caliel – Foi ele que capturou a alma de meu protegido.
     Checarion retomou a palavra.
     - Exato. Apesar de ter a alma tão corrompida a ponto de ganhar livre acesso ao Inferno mesmo antes de falecer, Dome Vorpa é um humano e, como tal, é guardado por um anjo. O relato de Bariel conta detalhadamente como o protegido dele atuou para adulterar teu relatório, Caliel; intento que levou à frente mesmo depois dos insistentes alertas e sinais de nosso irmão.
     - Bariel é nobre. Tenho certeza de que fez tudo o que estava em seu alcance – frisou Caliel.
    - Conta! Conta! Como foi que esse cara teve acesso ao relatório de um anjo da guarda? – afobou-se Celeste, ansiosa por saber toda história.
     Mais uma vez, Checarion falou.
     - Segundo o relatório de Bariel, o bico de pena que tu usas para escrever, Caliel, foi trocado por Dome Vorpa por um instrumento idêntico, porém imerso em magia negra de persuasão. Tal artimanha ocorreu em uma de tuas incursões ao Inferno, local em que teus poderes -- e os de qualquer outro ser celestial de menor hierarquia – ficam reduzidos.
     Caliel retrucou.
     - De que forma? Tomei todos os cuidados para não ser descoberto. Agi às escondidas!
   - Por causa de tua natureza de vigilante, tu estavas tão preocupado em resgatar Rui Rico que não protegeu a si mesmo de acordo, apesar de crer tê-lo feito. Ao escreveres teu relatório, a pena amaldiçoada confundiu teu raciocínio, escreveu trechos sem que tu percebesses e suprimiu outros que tu já registraras.
    - Não é possível! – espantou-se o anjo da guarda.
  - Assim que a investigação foi reaberta, encontramos o apetrecho infernal entre teus pertences – complementou o arcanjo – Eis o perigo de circular pelas galerias das trevas.
   Todos ficaram calados por um bom tempo. Margô e os amigos de laboratório, humanos que são, não sabiam o que dizer àqueles dois seres tão superiores. Caliel perguntava-se em segredo em que momento e como fora ludibriado em perceber...
     Coube a Checarion quebrar o silêncio.
      - Vamos embora agora?

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