21. O CLIMA ESQUENTA

     Dentro de uma garrafa empoeirada, mal acomodada ao pé do trono de ossos do rei do Inferno, nuvens de gases acinzentados contorciam-se entre si – moldando a expressão de um rosto apavorado. Era a alma de Rui Rico, enclausurada. 
     Com um estalo de dedo do chefão, um diabinho muito magro aproximou-se do Mestre do Mal.
     - Pegue a garrafa – foi a ordem que recebeu.
    Em dois segundos, o pobre magricela foi e voltou, trazendo o pedido do chefe em mãos. O Senhor das Trevas apanhou o objeto sem se virar e já começou o discurso.
    - Vocês desceram ao Inferno por causa disso daqui, não??!! – gritou ele, erguendo a garrafa a dois palmos de distância dos narizes de Margô e dos demais amarrados.
    Baldo tentou segurar, mas não se aguentou e deixou explodir uma risada. Margô, Zé e Rimo, mais contidos, estamparam um sorriso de escárnio.
    - Olha, não foi exatamente atrás desta garrafa que viemos. Mas, um gole não seria nada mal – falou Margô.
     Só então o capetão-mor notou o que tinha em mãos: uma garrafa de Coca-Cola.
    - Imbecil!!! – esgoelou-se o Senhor do Mal, instantes antes de atirar o objeto bem no meio dos chifres do assistente esquálido, que foi ao chão na mesma hora. – Tragam-me a garrafa com a alma do candidato! Agora!
    Um outro capetinha, tão magro quanto o primeiro, apressou-se em cumprir  a tarefa. Lúcifer voltou a sorrir ao notar a expressão esfumaçada de Rui Rico distorcer-se de espanto ao se ver nas mãos do ser mais malvado entre todos os malvados.
     - Tá com medinho? Tá com pavorzinho do pai? Hahahahaha! – provocou o capeta, batendo no vidro com a ponta da unha afiada. Em seguida, ele aproximou a garrafa dos próprios olhos arregalados e continuou o falatório – Você ainda sequer experimentou o que é medo de verdade!
     Zé deu um bocejo. Aquele blablablá todo lhe dava sono. Para não dormir em pé, ele rompeu com o mutismo tradicional e provocou:
      - O que você vai fazer, ó supremo Mestre do Mal?
    - Vou fazer você engolir a seco toda esta arrogância, bigodudo asqueroso! – berrou o demônio supremo, sem paciência.
     Em seguida, Lúcifer gritou uma nova ordem.
      - Acendam a fogueira!

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